sábado, agosto 15, 2009

Queremos querer.

"Querer alguém, ou alguma coisa, é muito fácil. Mesmo assim,
olhar e sentirmo-nos querer, sem pensar no que estamos a fazer,
é uma coisa mais bonita do que se diz. [...]
Querer é mais forte que desejar, pelo menos na nossa língua.
Querer é querer ter, é ter de ter. Querer tem mesmo de ser. [...]
Desejar tem menos. É condicional. Quem deseja, desejaria.
Quem deseja, gostaria. [...]
Querer é querer ter e guardar, é uma vontade de propriedade;
enquanto desejar é querer conhecer e gozar, é uma vontade de posse.
O querer diminui-nos, mas o desejar não. [...]
O que desejamos, dava-nos jeito; o que queremos fez-nos mesmo falta.
Mas tanto desejar como querer são muito fáceis.
Ter, isto é, conseguir mesmo o que se quer é mais difícil.
E reter o que se tem, guardando-o e continuando a querê-lo,
tanto como se quis antes de se ter, é quase impossível.
Há qualquer coisa que se passa entre o momento em que se quer
e o momento em que se tem. O que é?
"Cada pessoa, - dizia Oscar Wilde, - acaba por matar a coisa que ama".
Mata-a, se calhar, quando sente que a tem completamente. [...]
O ter destrói aquilo que o querer tinha de bonito.
Uma necessidade ocupa mais o coração,
durante mais tempo, que uma satisfação.
Querer concentra a alma no que se quer, mas ter distrai-a.
Nomeadamente, para outras coisas e outras pessoas que não se têm. [...] 
Trocavam-se todas as namoradas, ou todos os namorados,
que já se namoraram, pelo namoro de uma única pessoa que se quer namorar.
É esta a violência. É esta a injustiça.
Mas é esta também a beleza. [...]
Ter todas as pessoas não chega para nos satisfazer,
mas basta querer só uma, e não a ter, para nos insatisfazer. [...]
Em primeiro lugar, convém mentalizarmo-nos que querer
é desejável só por si, pelo que querer significa.
Quem tem tudo e não quer nada é como
quem é amado por todos sem ser capaz de amar ninguém.
Dizer e sentir "eu quero" é reconhecer, da maneira mais forte que pode haver,
a existência de outra pessoa e de nós.
Eu quero, logo existes. Eu quero-te, logo existo.
Em segundo lugar, ter também não é tão bom como se diz.
Ter alguém ocupa um espaço vital que às vezes é mais bonito deixar vazio. [...]
O segredo deve estar em conseguir continuar a querer, não deixando de ter.
Ou, por outras palavras, o melhor é continuar a ser querido
sem por isso deixar de ser tido.
O que é que todos nós queremos, no fundo dos fundos?
Queremos querer. Queremos ter.
Queremos ser queridos. Queremos ser tidos.
É o que nos vale: afinal queremos exactamente o que os outros querem.
O problema é esse." 

Miguel Esteves Cardoso

Obrigada, meu anjo*

SardinhaSemLataDois^

1 comentário:

Tita disse...

Só diz coisas certas, o gajo.